- Samanta Ribeiro de Almeida -
“Carrego meus primórdios num andor,
minha voz tem um vício das fontes.
Eu queria avançar para o começo
Chegar ao criançamento das palavras(...)”
Começo minha história com as palavras de Manoel, pois, além de admirá-lo e devorar suas poesias, também sou muito apaixonada pela infância e valorizo muito meu passado. Quanto a essa fase vejo que fui muito privilegiada, ainda mais comparando com o presente, onde vejo as crianças cada vez brincando e interagindo menos umas com as outras, sendo mais amigas de eletrônicos do que das pessoas, cada vez mais presas, é triste.
Cresci em casa de vó, eu e mais três crianças (meus primos, Karol e André, e minha irmã, Jéssica), brincávamos muito juntos e ainda estudamos, durante muito tempo, no mesmo colégio.
O colégio que estudei era muito legal, tinha parque, passeio, duas quadras grandes, brinquedoteca e muita liberdade para criar e ser criança, as brincadeiras eram muito valorizadas e incentivadas pelos professores, era um colégio particular, estudei lá porque minha mãe trabalhava como professora, eu e minha irmã éramos bolsistas, dou muito valor ao esforço da minha mãe e sou grata por ter vivido essa experiência. Meu brincar na infância foi dividido entre o colégio e a casa da minha avó, tiveram outros lugares, mas esses dois foram onde passei mais tempo e que guardo com muito amor.
Na casa da minha vó brincávamos muito de correr, se esconder, escolinha, detetive, contar e ler histórias juntos e por aí vai, brincadeira era o que não faltava, alguns acidentes rolaram também, mas faz parte.
Além das brincadeiras, nossa família sempre valorizou que fizéssemos algum esporte, ainda mais que ficávamos os quatro com minha vó depois da escola, tínhamos que ter mais alguma atividade para não enlouquecê-la; além de cuidar da gente ela também trabalhava no salão.
A casa da minha vó é bem grande, quer dizer, a casa em si não é tão grande, mas têm várias casas juntas, uma em cima, outra do lado, outra no fundo do quintal e ainda tem o salão de cabeleireira, onde ela trabalhava atendendo sozinha o dia todo. Voltando ao assunto esporte, por um tempo tentei praticar balé com minha irmã e prima, mas não deu muito certo e acabei entrando no tae-kwon-do e capoeira com meu primo, eu e ele crescemos muito juntos, fazíamos várias estripulias com minha vó e meu vô, que sempre acabava brincando com a gente, ele sempre foi muito brincalhão.
Eu e meu primo brincávamos de luta, quando a casa passou por uma reforma, construíamos passagens secretas, de uma casa para a outra com os tijolos e montes de areia, também brincava com os bonecos e videogame dele, batíamos figurinha e víamos desenho de manhã juntos antes de irmos pra escola.
Lembro que nós quatro tivemos a fase de adorar algumas bandas e, quando assistíamos aos clipes que passavam na MTV e a novela Chiquititas, imitávamos algumas coreografias, menos o André que tinha vergonha, e fazíamos apostas de qual seria o próximo clipe.
Também brincávamos bastante na rua nos finais de semana, quando ganhamos bicicleta, meu pai saia com a gente pelo bairro, também saíamos para passear com os cachorros, houve um época em que cada um tinha o seu, quatro cachorros na casa, coitada da minha vó! hauhaua
Quando chegavam as férias, viajávamos juntos para a praia, sempre parávamos no meio do caminho para comprar doces, batata frita e frango para comer no caminho.
Depois de um tempo, acabei me mudando da casa da minha avó, passei a morar num prédio perto do colégio, lá fiz amizades e sempre descia para brincar no parquinho ou na casa de alguma das meninas.
Uma vez brincamos de cabra cega e quase morri de medo, porque o irmão dela ficava fazendo vozes horripilantes para nos ouvir e descobrir onde estávamos, lembro também que uma vez, brincando de pega-pega, fui correr no hall do prédio e bati o rosto com tudo na parede, fiquei com cicatriz na testa igual ao do Harry Potter, todos na escola racharam o bico quando me viram no dia seguinte.
Eu e meu primo continuávamos nossas brincadeiras mesmo de longe, às vezes ele ficava no prédio comigo ou eu ia para a casa da minha vó, onde ele ainda morava, para treinarmos as lutas e fazer natação, mais à noite meu vô me levava de volta pra casa. Nessa fase, as meninas, que são três anos mais velhas que a gente, já estavam preocupadas com outras coisas.
Passados alguns anos, já adolescente, quando viajávamos, ou quando nos encontrávamos na casa da minha vó, começamos a brincar mais de carta e jogos de tabuleiro (banco imobiliário, jogo da vida, dominó, baralho).
Nessa fase que morei no prédio, apesar de ter as amigas do condomínio, lembro de começar a passar mais tempo sozinha, foi quando comecei a me virar com minha irmã, já que meus pais passavam o dia fora trabalhando.
Sempre fomos muito responsáveis e ajudávamos desde antes na limpeza da casa, mas vejo que foi nesse momento que acabei deixando de brincar para ajudar, o que me fez bem também, pois vejo que criei outra consciência sobre ajudar em casa e lidar com as responsabilidades. Do grupo de amigas, fui eu quem começou a trabalhar mais cedo, mas sempre permaneci em contato com meu lado criança.
Atualmente, na fase adulta, vejo que nunca deixei e nunca deixarei de brincar, continuo brincando com amigos e familiares, meu amigos adoram brincadeira de roda com dança, saímos para dançar coco e forró, às vezes eles brincam de criar repentes. A cada ciclo as brincadeiras mudam, mas sempre existe alguma, como por exemplo, comecei a tocar um instrumento que chama “agbé”, treinar os movimentos e ver que meus pais adoram mexer nele quando passam pelo meu quarto, mostra que o movimento continua presente.
Além disso, sou professora, assim como minha mãe e irmã, e isso faz com que eu nunca perca esse contato, faz parte da minha rotina, adoro brincar e ver as crianças brincando, passo muito do que aprendi pra elas e sempre priorizo esses momentos. Acredito que perder esse contato é o que entristece o ser humano, depois que se deixa de brincar a pessoa se enrijece de um jeito que perde o brilho.
Evoluímos sempre, as brincadeiras mudam de forma e até de cor, mas sempre estão presentes, ainda bem!
Comments