- Nicole Cristina da Costa -
Por meio da brincadeira, a criança é capaz de interagir com o mundo a sua volta: é brincando que ela aprende a se relacionar com o outro, a lidar com situações problema, a usar sua criatividade, sua imaginação, entre muitas outras coisas.
As crianças tem o direito de brincar garantido por lei, tendo em vista que este é um fator primordial para seu desenvolvimento pleno. Nesse sentido, os agentes do brincar experimentam diversas oficinas com a intenção de sentir e de entender melhor esse processo para então compreender como ele se dá na infância e qual a melhor maneira de agir/interagir ou não no momento da brincadeira. O presente artigo tem como finalidade discutir a importância do brincar saudável e o papel dos agentes do brincar nesse processo.
Os agentes do brincar
O Agente do Brincar, ou mais conhecido fora do Brasil como Playworker, tem por objetivo criar condições para que as crianças possam brincar livremente. Nesse sentido, diferente do que muitas vezes se imagina, os Agentes do Brincar não são aqueles que vão impor a criança determinada brincadeira, mas sim aqueles que vão apoiar e estimular as crianças nas brincadeiras que elas escolhem e com o quê e quem elas escolhem brincar. Nesse sentido, é importante que as crianças tenham a possibilidade de tomar suas próprias decisões.
Esses profissionais destacam-se no cenário atual da nossa sociedade, pois eles são capazes de interagir com a criança de maneira lúdica, promovendo um brincar menos adultocêntrico e mais democrático para a criança. Tendo em vista que não há ainda outra profissão que tenha como um de seus objetivos garantir um brincar livre. Para se tornar um Agente do Brincar não é necessário ser um profissional ligado a área da educação, porém é necessário ter um compromisso verdadeiro com o direito de brincar, entender como ele se dá nas relações interpessoais, percebendo como mediar e participar desse processo.
Brincar e tecnologia
Atualmente, com os avanços das tecnologias, a nossa sociedade vem se modificando: as pessoas estão sendo cada vez mais atraídas por “aparatos tecnológicos”, como smartphones e tablets, por exemplo, interagindo cada vez menos com as pessoas a sua volta. Essa mudança, por sua vez, acaba afetando não só aos adultos, mas também às crianças, que por consequência, carecem de atenção dos membros de sua família.
Com o advento desse modo de vida, as crianças estão cada vez mais atarefadas com atividades escolares que os pais acreditam que trarão um “futuro brilhante” para elas, implicando em menos tempo para brincar e até mesmo para descansar.
O fato é que essas tecnologias já estão tão enraizadas na nossa sociedade que dificilmente há como evitar a exposição das crianças maiores a esse tipo de material, porém há como diminuir esse tempo. Para tanto, é preciso criar estratégias para conciliar o uso dessas tecnologias, e nesse processo o acompanhamento dos pais é essencial.
Uma pesquisa publicada em 2012 pela revista Archives of Disease in Childhood, alerta para os riscos de se expor as crianças por períodos longos de tempo a televisões, computadores, videogames, tablets e até smartphones. Segundo Sigman, autor da pesquisa, quanto maior o tempo de exposição, maiores são os riscos de problemas como o déficit de atenção (VEJA, 2012).
Sendo assim, é necessário que haja uma moderação do tempo de exposição da criança a esses materiais e um constante acompanhamento e atenção dos pais, para que não se torne somente algo que tenha como objetivo prender a atenção das crianças enquanto os adultos realizam outras atividades, podendo inclusive, ser prejudicial à saúde delas.
O direito de brincar
A criança tem o direito de brincar garantido pela Lei Federal nº 8069/90, e “o direito ao descanso e ao lazer, ao divertimento e às atividades recreativas próprias da idade, bem como à livre participação na vida cultural e artística”, acordados pela convenção sobre os direitos da criança - CDC (BRASIL, 2015), ambos fundamentais para seu desenvolvimento.
Portanto, é necessário proporcionar mais tempo a criança, deixar que ela aprenda a tomar suas próprias decisões quanto ao que ela deseja fazer.
Quando a criança brinca, ela não “está só brincando”, ela está construindo sua identidade, está se desenvolvendo mental e fisicamente a cada obstáculo que ultrapassa e a cada problema que aprende a resolver. E ainda a diversão que a brincadeira proporciona para todos que dela participam. De acordo com o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998, p.15)
As crianças se movimentam desde que nascem, adquirindo cada vez maior controle sobre seu próprio corpo e se apropriando cada vez mais das possibilidades de interação com o mundo. Engatinham, caminham, manuseiam objetos, correm, saltam, brincam sozinhas ou em grupo, com objetos ou brinquedos, experimentando sempre novas maneiras de utilizar seu corpo e seu movimento. Ao movimentar-se, as crianças expressam sentimentos, emoções e pensamentos, ampliando as possibilidades do uso significativo de gestos e posturas corporais. (RCNEI, 1998, p. 15).
Nesse sentido, o agente do brincar é aquele que irá buscar maneiras de proporcionar um ambiente saudável, ou seja, um ambiente que favoreça as relações da criança com o outro e com o meio, de maneira que ela possa se sentir segura para tentar algo novo, vencendo desafios, se arriscando e se descobrindo.
As crianças, desde muito pequenas, não precisam de muito para se divertir. Não precisam de brinquedos caros, daqueles que “fazem tudo sozinhos”. Elas têm uma habilidade incrível de imaginar e transformar qualquer objeto em brinquedo. Independente de classe social, elas dão um show no quesito brincadeira e incentivar que elas usem cada vez mais sua imaginação e criatividade é imprescindível.
Brincadeira é aprendizagem
Os agentes do brincar, durante sua formação, experimentam, vivem e refletem acerca das brincadeiras e oficinas oferecidas. Com essas oportunidades de experimentação, o que se pretende é formar um profissional capaz de compreender a partir de sua própria experiência, de que maneira lidar nas situações que envolvem o brincar.
Compreender e respeitar o momento da brincadeira como algo sério faz parte do perfil desse profissional. De acordo com Gusso e Schuartz (p.237, 2016), quando a criança brinca, trabalha com suas limitações, com as habilidades sociais, afetivas, cognitivas e físicas. O brincar é ainda uma forma de expressão e comunicação consigo, com o outro e com o meio. A brincadeira é considerada uma atividade universal que assume características peculiares no contexto social, histórico e cultural. (GUSSO; SCHUARTZ, p. 237, 2016).
Brougère (1998) apresenta uma concepção de brincadeira enquanto aprendizagem social que abrange todo o ambiente que envolve a criança, tanto relações, como imagens, objetos, entre outros, formam a cultura lúdica da mesma. Desta forma, observa-se que a criança não é simplesmente um receptor, mas um sujeito ativo que modifica e é modificado pelo meio social. Logo, é através da brincadeira que a criança se mostra como um membro da sociedade.
Portanto o brincar aparece como forma de integração da criança na sociedade e passa a reclamar um lugar mais significativo do que o que ocupa até o momento - geralmente como distração ou descarga de energia excessiva. A aprendizagem se constrói a partir da interação que a criança realizada em seu meio social devendo ser estimulada sempre que possível, daí a relevância do brincar (BROUGÈRE, 1998).
Os agentes do brincar, pensando nessa concepção, conhecem e reconhecem na brincadeira os elementos culturais dos quais ela se serve e, a partir dessa leitura pode, a princípio, fornecer para a criança os meios, materiais ou não, para o aprofundamento da brincadeira.
De acordo com Gusso e Schuartz (p.239, 2016), a criança é “um ser sociável que se relaciona com o mundo que a cerca de acordo com sua compreensão e potencialidades e brinca espontaneamente, independentemente do seu ambiente e contexto”. Sendo assim, é necessário pensar em uma infância com novas características, além disso, é de extrema importância refletir sobre o brincar com suas possibilidades e dificuldades. Tendo em vista que é por meio da brincadeira que a criança faz a experiência do processo cultural e da interação simbólica, em toda a sua complexidade.
Considerações finais
Entender como de fato o brincar interfere diretamente no desenvolvimento infantil faz parte da formação do agente do brincar. A criança, a maior protagonista da brincadeira, é um ser de direitos, e como tal merece que eles sejam respeitados e garantidos, já que sua Finalidade é garantir um crescimento e desenvolvimento saudável. Sendo assim, o brincar torna-se uma ferramenta indispensável no sentido de garantir uma infância plena e feliz. Penso que o brincar é a maior e melhor ferramenta que o ser humano possui e saber de que modo aperfeiçoá-la, faz parte do trabalho exercido pelo agente do brincar.
Refiro-me a aperfeiçoá-la não no sentido de modificá-la de alguma maneira, mais sim de saber aproveitar o melhor que o brincar pode oferecer. Por isso que reitero, quando a criança brinca, ela não “está só brincando”, ela está construindo sua identidade, está se desenvolvendo mental e fisicamente a cada obstáculo que ultrapassa e a cada problema que aprende a resolver.
Deste modo, o agente do brincar, munido de experiências e vivências, será capaz de providenciar materiais, espaço e meios para que a criança tenha a oportunidade de desfrutar de um brincar saudável e livre, podendo assim se sentir segura, vencer desafios e desenvolver autoconfiança.
Referências
BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente: Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, e legislação correlata. Disponível em: <http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/18403/estatuto_crianca_adolescente_13ed.pdf?sequence=27>. Acesso em: 12 jun. 2017.
BRASIL. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/volume3.pdf>. Acesso em: 12 jun. 2017.
BROUGÈRE, Gilles. A criança e a cultura lúdica. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/rfe/article/view/59630/62727>. Acesso em: 15 jun. 2017.
GUSSO, Sandra de Fátima Krüger; SCHUARTZ, Maria Antonia. A criança e o lúdico: a importância do “brincar”. Disponível em: <http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2005/anaisEvento/documentos/com/TCCI057.pdf>. Acesso em: 15 jun. 2017.
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