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Ir ao museu me levou à infância

  • Foto do escritor: IPA Brasil
    IPA Brasil
  • 10 de ago. de 2020
  • 3 min de leitura

-Renata Silvia-



Nosso destino, neste sábado frio e de um aguaceiro que só o encontro de São Pedro com São Paulo pode proporcionar, é o MASP. Relembro que a primeira e única vez que estive no Museu de Arte de São Paulo foi em 1996 quando da exposição das obras de Salvador Dali.


E lembro que fiquei encantada com o acervo, bem como com o tamanho e a estrutura do MASP: apesar de conhecer um tantão de museus em boa parte das cidades das regiões sul e do sudeste do Brasil, nunca havia entrado em um tão grande! Literalmente me senti uma criança naquele domingo...

E hoje debaixo dessa chuva toda, mesmo ainda troncha por conta de uma gripe que não me deixou pregar o olho a noite inteira, minha criança interna não hesitou em dar boas risadas por conta das enormes poças d’água que tive que pular: atravessar a Paulista debaixo de um enorme dilúvio com os pés encharcados tentando não tropeçar foi uma aventura e tanto! Me percebi animada e brincando, mesmo gripada e toda molhada.

E me percebi também atravessada por uma ansiedade brejeira de querer chegar rápido ao destino, e que acabou por me fazer recordar da infância caiçara: era a mesma sensação que eu tinha quando, no inverno, ia até a Ponta da Praia para brincar com as grandes ondas da ressaca que se arremessavam contra a amurada.

Depois de encontrar a turma em frente à bilheteria e de provar um delicioso mousse de cambuci, eis que começa nosso tour pela infância retradada em diversas linguagens nos dois andares a que tivemos acesso. Dois pavimentos esses que têm espaço suficientemente bom para intervenções lúdicas com adultos e crianças. Haja vista que as jovens de nossa turma aproveitaram para se divertir no playground dando boas risadas: mais uma excelente recordação que guardarei com carinho dessa formação profissionalizante.

Mas atendo-me ao acervo temporário em si, à exposição propriamente dita, o que mais me marcou foi o contraponto feito pela disposição das obras, especialmente das telas que retratavam as infâncias aristocráticas da Europa e as infâncias humildes do Novo Mundo: lado-a-lado um desconcertante paradoxo, intencionalmente criado, chamava à reflexão tantos quantos por ali se permitissem ser afetados pela provocação benfazeja!

Algumas das obras expostas me levaram de encontro às lembranças de minha própria infância e da dos meus irmãos e primos também. Foi impossível deixar de me ater ao quanto de ressignificação foi surgindo à medida em que ouvia cada comentário feito pelas pessoas ao meu redor: o que nos idos de minha infância era também diversão, aventura e ganho de autonomia e de independência, atualmente passou a ser encarado apenas como trabalho infantil.

E já me explico: lembro do dia em que meus irmãos descobriram que havia um senhor que comprava garrafas e metais velhos lá no fim da rua. Rapidamente chamaram um vizinho da mesma idade deles e os três juntos deram um jeito de encher um carrinho de feira com sucatas, jornais e traquitanas para vender para o tal ferro-velho de modo a ter dinheiro para comprar papel de seda, varetas e linha. Logo três pipas ganhavam o céu perto da linha-do-trem.

Me recordei também de uma das semanas entre Natal e Ano Novo quando, em Itanhaém na casa da nossa Vó, meus primos mais velhos ficavam ansiosos para poderem fazer parte dos dois rituais de passagem: conseguir acompanhar nossos tios na caça aos caranguejos e conseguir que meu avô deixasse que eles fossem vender chup-chup para os turistas na praia. Primos mais velhos, leia-se: meninos de dez, onze e doze anos. Para eles era pura diversão, uma farra sem tamanho, uma grande brincadeira que, de quebra, vinha acompanhada de alguns bons trocados para pipas e chicletes.


Bons tempos aqueles: tempos em que a infância era de fato vivida, independente da situação socioeconômica. Não havia dinheiro para comprar brinquedos, mas isso não nos fazia menos alegres: inventávamos e construíamos nossos próprios. Não havia muita condição de comprar roupas ou calçados novos a cada estação: éramos gratos ao receber dos primos maiores, e cuidadosos para podermos repassar para os menores quando não mais servissem em nós mesmos. O cuidado, o não desperdício e o zelo faziam parte de nosso cotidiano, e isso não fazia com que nos sentíssemos menores ou menosprezados. Muito ao contrário: o lema era pobrinho, mas sempre educado e limpinho.



Os tempos passaram e com eles muitas mudanças impactantes sobrevieram. O Capetalismo (não digitei errado não senhor: para mim é capetalismo mesmo) se instalou rapidamente após a chegada da televisão, e com ele a paranoia do consumismo. Infelizmente noto que as crianças voltam aos poucos a ser os mini-adultos, tal qual nos idos tempos da revolução industrial... Brincar, criar e questionar é preciso. Navegar, viver é preciso!!!

 
 
 

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