- Bruno Tavares da Silva Josino -
O lúdico é uma característica do ser humano. Ele está ligado diretamente ao divertimento e ao brincar. A ludicidade é historicamente encontrada em épocas e povos distintos, porque é uma expressão humana da liberdade e uma maneira de interação com o mundo como refúgio da obrigação ou até mesmo dentro dela.
Diversos autores trazem a temática do brincar sob vários olhares. Existem concepções que reconhecem no brincar a importância para o crescimento físico, expressões corporais, desenvolvimento do potencial criativo, relacionamentos grupais, possibilidade autoterápica para saúde mental e até mesmo para a Constituição da Subjetividade. “Essa atividade [brincar] proporciona um momento de descontração e de informalidade (...) um papel fundamental na formação do sujeito e da sua personalidade.” (PEDROZA, 2005, p. 62), assim a partir do contato com a multiplicidade de situações e vivências pelo brincar, a pessoa aprende, cria e recria seu mundo.
A infância é a fase da pessoa se reconhecer no mundo e sua formação de identidade movimenta-se de acordo com as pré-condições propostas a ela, ou seja, existem fatores psicossociais, econômicos e familiares simbólicos influenciadores neste processo mesmo que implicitamente e compõe a pessoa que a criança é e como esta lida com as situações que se dão na vida em sociedade.
Regina Pedroza refere-se à brincadeira, enquanto espaço de lazer e percebe a viabilidade de as crianças demonstrarem-se emocionalmente e desenvolve que:
“Através da brincadeira, a criança tem a possibilidade de experimentar novas formas de ação, exercitá-las, ser criativa, imaginar situações e reproduzir momentos e interações importantes de sua vida, resignificando-os. Os jogos e as brincadeiras são uma forma de lazer no qual estão presentes as vivências de prazer e desprazer”. (PEDROZA, 2005, p. 62)
As brincadeiras, jogos e as relações com brinquedos devem ser entendidos como tempo fundamental para as crianças expressarem ali momentos de prazer e alegria que podem ser o motor de muitas atividades, de possibilidades de aprendizagem e de desenvolvimento como também momentos de manifestarem angústias, tristezas e situações que estão presas dentro de si.
O brincar e a ludicidade aparentam-se serem adequadas apenas às crianças, entretanto os adultos podem vivenciar de outras formas que não infantis ou até mesmo com as próprias crianças. O adulto junto à criança tem resistência, em um primeiro momento, mas é possível viver momentos repousantes à medida que percebem a necessidade e a importância de se desligarem de suas preocupações, afinal brincar pode ser uma ótima alternativa intergeracional que viabiliza a troca de conhecimento de brincadeiras mais tradicionais e aquelas praticadas atualmente, onde gera-se uma rica vivência mútua de permutação de experiências.
Os fatores influenciadores no afastamento das pessoas ao lúdico são as obrigações superestimadas na sociedade, que no mundo contemporâneo apresentam-se no trabalho, nos estudos e nas demais responsabilidades encontradas principalmente na fase de “gente grande” e faz com que o brincar seja visto como perda de tempo, pois não correspondem aos ideais do mundo adulto e em muitas circunstâncias até as crianças são colocadas diante destes ideais sendo privadas de seu direito de brincar, porque precisam se dedicar ao futuro de sucesso.
Os projetos de futuro tanto dos adultos para eles mesmos ou as projeções para as crianças perpassam por: sonhar, imaginar e se planejar para alcançarem o ponto de supervalorização tão recorrente no imaginário social de um profissional bem sucedido, de carreira acadêmica impecável, e consequentemente a felicidade pessoal, entretanto:
“Às vezes, sim, nossos sonhos quebram algumas coisas no seu percurso ou são atravessados por coisas que vão sendo quebradas ao longo do caminho. Isso faz parte da condição de estar vivo.” (REDIN, 2007, p. 83).
Então surge a figura do Agente do Brincar. De acordo como Marilena Martins:
“Agentes do Brincar são as pessoas que, com conhecimento e competência, criam as oportunidades para que as crianças brinquem livremente. Podem ser: jovens, pais, educadores, profissionais, estudantes, voluntários de organizações da sociedade civil, pessoas na terceira idade. Além do conhecimento teórico prático precisam ter algumas habilidades (...).” (MARTINS, 2013, p. 6)
O Agente do brincar é profissional que trabalha com a temática lúdica e não com o projeto de vida esquematizado, pois entende o brincar, seja pelas brincadeiras, pelos jogos e pelos brinquedos como direito indispensável na vida da criança, como possibilidade de resolução de problemas internos, externos e para seu desenvolvimento integral, ou seja, social, físico, intelectual, psicológico e familiar. Este desenvolvimento integral proporciona caminhos para que esta criança em seu processo de crescimento interaja com meio respeitando si mesma e o mundo em suas diferenças e para o adulto tem relevância por ter a capacidade de resgatar uma infância que se perdeu, períodos de autorreflexão ou apenas permitir momentos de alegria que já é o bastante.
Este profissional pensa o brincar direcionado ao humano independente de idade, classe, identidade, enfim percebe o contexto ao qual está inserido para oportunizar condições de autonomia, espaços de coletividade e o fim é o empoderamento do sujeito para que se perceba como um ser brincante que produz cultura:
“A cultura é, portanto, a revelação dos espaços e formas que lidam com elementos simbólicos do processo criativo: a imaginação, o lúdico, a projeção, a fantasia, o mistério, o cósmico, a poesia...” (REDIN, 2007, p. 85).
O Agente do Brincar tem papéis importantíssimos: de favorecer o sonho e a fantasia sem a obrigatoriedade de resultados quantitativos e concretos, pelo contrário, o qualitativo é o mais aguardado. Apesar de existirem inúmeros estudos sobre o brincar para, de fato, explicarem os benefícios ao sujeito e assim validar sua real importância, ainda assim o brincar é o fim nele mesmo, ou seja, é um direito e deve ser de responsabilidade mútua do adulto, família, sociedade civil, escola, empresas e o Estado.
O Agente do Brincar compila todas estas visões sobre o brincar que vai desde propor momentos de lazer até sendo ele constituinte do sujeito, mas acima de tudo, é um facilitador de momentos e espaços saudáveis onde a brincadeira se dará, portanto as atividades devem ser oferecidas a todos para que as pessoas julguem o que de fato são importantes a elas.
O profissional trabalha sob a perspectiva de atividades espontâneas, não é porque as direcionadas não tenham sua relevância, mas o brincar livre é o foco principal, pois não tem o caráter educacional explicitamente, até porque o desenvolvimento acontece nas relações que se estabelecem nas situações vivenciadas.
Pelo lado de formação, o profissional desta área perpassa por atividades teóricas e práticas que fundamentam os vários aspectos que estão às margens do brincar como relacionamentos interpessoais, às questões de acesso à cultura e às artes e sobre tudo o desenvolvimento humano. É de extrema importância ampliar o debate e criar redes de possibilidades para trazer mais profissionais e o reconhecimento da área, porque o brincar é coisa séria e deve ser valorizado pelo que é e por sua significância para a humanidade, pois através de atividades simples, vivências particulares e em grupo, o universo seja descoberto e receba um significado único que faça sentido ao sujeito.
Referência Bibliográfica
MARTINS, Marilena Flores. Brincar e o Desenvolvimento da Criança. In: Guia do Agente do Brincar. São Paulo, 2013, p. 27.
PEDROZA, Regina Lúcia Sucupira. Aprendizagem e subjetividade: uma construção a partir do brincar. Rev. Dep. Psicol., UFF. Niterói, v. 17, n. 2, 2005, p. 61-76.
REDIN, Euclides; MÜLLER, Fernanda; REDIN, Marita Martins (org.) Infâncias cidades e escolas amigas das crianças. Porto Alegre: Mediação, 2007, p. 83-89.
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